Uma vida de saudade

Há alguns anos atrás, quando me mudei para Barcelona para cursar minha pós graduação, me vangloriei muito para amigos e conhecidos de que havia conseguido manejar muito bem a minha saudade durante todo o tempo que estive fora.

Parte desse feito, se dava ao fato de eu me considerar privilegiada por estar tendo aquela experiência, eu estava realizando um sonho, eu tinha feito vários novos amigos, eu tinha um emprego, até mais de um, eu vivia coisas novas todos os dias. E, em algum cantinho escondido da minha mente estava a ideia de que tudo aquilo vivido ali era passageiro. A sensação de temporalidade, era para mim, como um baú, que eu podia abrir quando quisesse para renovar as minhas forças. “Passaria”, tudo ali passaria. Eu terminaria o curso, eu voltaria para casa, eu reencontraria meus amigos, minha família, até mesmo o namorado, do qual me separei antes de partir. E após retornar ao lar, eu realmente enchi a boca para falar que eu havia lidado tão bem com o afastamento, com a distância do meu lar.

Pois, eis que, cá estou novamente, longe de casa. Os quilômetros de separação agora são muito menores, assim como o tempo e o dinheiro necessários para um reencontro, só que o critério de temporalidade não existe mais. Eu não sei se um dia vou voltar, eu não sei para onde exatamente eu voltaria, e não sei se talvez não vá parar em algum lugar novo. Me dei por conta de que agora vivo num estado constante de uma vida de saudade. E vou ter que aprender a lidar a com isso.

As visitas serão mais frequentes, mas não se comparam à condição de quem tem o acesso rápido e fácil à comidinha da mamãe ou ao ombro do melhor amigo. Nunca se comparam à ligação que diz: “estou aqui embaixo, desce!”, ou a sair na rua sozinho, e logo cruzar com conhecidos e amigos pelo caminho. A reconhecer os lugares por onde passo, porque junto com eles vem uma lembrança. Nossa história no lugar se constrói de acordo com o tempo que passamos ali, e muitas vezes, é a história de uma vida inteira, de uma meia vida, talvez. Difícil abandonar tudo isso, difícil admitir que estamos na verdade construindo tudo de novo, no trabalho, em casa, conhecendo gente nova, e mais importante, tentando encontrar aquele seleto grupo com quem podemos contar em todas as horas.tumblr_static_artworks-000076154861-njl9da-original

É essa saudade que eu tenho que manejar agora, sentir a falta repentina de um lugar, de uma comida, de um membro da família que talvez eu nem visse com tanta frequência, mas que morava logo ali. Sentir falta daquele dia da semana reservado para o encontro das meninas, que hoje virou um grupo de WhatsApp. Sentir falta de sentar na frente da lareira e beber vinho com a minha mãe, de encontrar meu pai e meu irmão no “brique”, de pegar a freeway no domingo de manhã só para passar o dia no sítio. Algumas coisas não tem substituição, vão deixando pequenas lacunas que vão sendo preenchidas por novas descobertas, mas é como se fosse um quebra-cabeça, onde as peças não encaixam perfeitamente, você coloca algo ali na tentativa de ocupar um espaço, mas elas não tiram de você a sensação… de saudade.

 

p.s. Terminei de escrever esse texto e recebi de duas amigas diferentes a mesma crônica, que termina de explicar o que é a minha saudade!

Solte o verbo aqui!